quinta-feira, 15 de abril de 2010

+ Abril pro rock



Festival pernambucano realiza 18ª edição durante todo o mês, mas com os shows principais nesta sexta-feira e sábado.

por Luciano Matos

© 2010 :: el Cabong

Em poucos anos, o Festival Abril Pro Rock, em Recife, passou de palco de resistência do rock local para espaço de revelação de nomes para gravadoras. Com a crise da indústria e o fortalecimento do mercado independente, se consolidou como um dos principais eventos para apresentação da nova cena brasileira.

Com esse histórico nas costas e a responsabilidade de continuar interessante, o festival comemora seus 18 anos com um evento espalhado durante todo o mês em Recife, mas com foco nos dias 16 e 17, quando recebe alguns dos nomes mais relevantes da música atual no Brasil e convidados estrangeiros.
O ex-Iron Maiden é um dos destaques do festival.

De volta ao Pavilhão do Centro de Convenções, o festival será palco nos dois dias tradicionais de mais de 20 bandas nacionais e internacionais. Entre os gringos, o ex-vocalista do Iron Maiden, Blaze Bayley; a banda americana Agent Orange, umas das primeiras a misturar punk com surf music, e a inglesa The Varukers, que realiza turnê mundial comemorando 30 anos de punk hardore. Eles se apresentam no primeiro dia do evento, sexta, tradicional noite voltada para o rock pesado.

No sábado, o festival recebe um dos fundadores do hip hop e do funk, o DJ e produtor norteamericano Afrika Bambaataa, e o Instituto Mexicano Del Sonido, projeto do DJ e produtor mexicano Camilo Lara, que funde música popular com programações eletrônicas.

Se os estrangeiros ajudam a tornar o festival atraente, são os nomes da música brasileira contemporânea que o tornam atualizado e ainda mais interessante.

Veteranos como Ratos de Porão, na sexta, e Pato Fu, no sábado, servem como chamariz para a nova geração.

A noite de sons mais pesados traz ainda respeitados nomes do heavy metal nacional. Destaque para os paulistas da Claustrofobia, que, com 16 anos de estrada, começam a chamar atenção na Europa, de onde acabam de chegar de uma turnê, e para os mineiros do Eminence, que também estão com um pé no exterior.

A noite é completada com as bandas pernambucanas Terra Prima, Inner Demons Rise e Alkymenia, além do quarteto instrumental de surf music The Mullet Monster Máfia.
O alagoano Wado apresenta a sua música brasileira contemporânea

Diversidade Outra tradição que se tornou característica do Abril Pro Rock é a capacidade de reunir numa mesma noite uma gama de artistas de diversas sonoridades. A programação do sábado comprova que isso ainda é levado em conta, mesmo que o acento esteja mais no rock.

Além dos nomes citados acima, que tal mesclar o bom indie rock dos locais do The River Raid com a música brasileira do alagoano Wado? Ou o projeto 3 na Massa, com várias cantoras e um clima sensual de cabaré, com o som dark dos cearenses do Plastique Noir.

Há ainda o hard rock e mod dos sergipanos da Plástico Lunar, o garage rock do Bugs, do Rio Grande do Norte, e algumas das apostas do cenário independente, o rock pop do Nevilton, a tropicália moderna do Mini Box Lunar e o rock instrumental dos baianos da Vendo 147.

Festivais reforçam circuito para nova geração de bandas e artistas pelo País
Além do Abril Pro Rock, vários festivais também com foco na música independente e em novos artistas acontecem nas próximas semanas, reforçando um circuito que tem feito uma nova geração de artistas e bandas circularem pelo país. Essa semana acontece a edição carioca do Festival Fora do Eixo, que começou em São Paulo, no último fim de semana e segue no Rio de Janeiro com nomes como Canastra, Brasov, Black Drawing Chalks, Porcas Borboletas, Do Amor e Macaco Bong.

Em Palmas, no Tocantins, acontece de 15 a 17 de abril o 7º Tendencies Rock Festival, que faz um apanhado das bandas locais mescladas com novos nomes do cenário nacional e alguns nomes de maior peso. Entre eles estão o ex-Legião Urbana, Dado Villa-Lobos, a reencarnação dos Raimundos e a atração internacional Blaze Bayley, ex-Iron Maiden.

Em Goiânia, de 19 a 22 de maio, será realizado o Festival Bananada, conhecido por apostar em nomes que estejam despontando até mesmo no cenário independente, além de reforçar o cenário local. Comprovando isso, a edição desse ano tem como destaques nomes como Burro Morto (PB), Nevilton (PR), Camarones Orquestra Guitarrística (RN), Plástico Lunar (SE), Caldo de Piaba (AC), os baianos da Vendo 147, além de 25 bandas locais, entre elas a badaladas Violins e Black Drawing Chalks.
A temporada de festivais nesse primeiro semestre tem ainda o Festival Goma, em Uberlândia, Minas Gerais, que aproveita algumas bandas que estão realizando turnê pelo país, como os paraibanos do Burro Morto e Nublado e a Camarones, de Natal, além de artistas da região.

Entrevista com Paulo André, produtor do festival Abril Pro Rock

- O Abril está copletando 18 anos, queria que falasse qual a proposta do festival esse ano, qual a proposta do festival e quais as novidades?

Paulo André – A proposta de 2010 está sintonizada com a dura realidade do Recife e de PE. Estamos atuando nos gargalos da cidade. Por exemplo, fizemos uma parceria com a Sec. Especial da Juventude e Emprego do Gov. de PE, para realizarmos uma série de capacitações voltadas pros jovens com interesse nesse mercado. Foram 240 vagas com mais de 800 inscritos, sucesso absoluto. Fiquei feliz em ver tanta gente na cidade querendo aprender e entender esse novo mercado da música. Aqui não temos clubs, não temos rádio e não temos mercado. Criamos o APR Club, pelo menos em Abril durante 7 noites, teremos um espaço de médio porte com boa programação, bom som, bom ambiente, sendo uma boa opção de diversão que atualmente não existe na cidade do Recife. Além disso, dobramos a quantidade de bandas na sexta e aumentamos em 50% as bandas do sábado, sendo 5 atrações internacionais nos 2 dias de APR, além das atrações do APR club.

- Antes o festival servia como um celeiro de novidades, especialmente para as gravadoras. Ele perdeu essa função? Quual a função um festival como o Abril tem nos dias de hoje?

Paulo André – Para as gravadoras sim, pro mercado não. Basta dar uma olhada na programação dos ultimos anos e ver a quantidade de bandas novas de todo o Brasil que apresentamos. Desde sempre 70% da programação do APR são de bandas com baixíssimo potencial de público, pelo menos aqui no Recife. A grande função continua sendo fomentar e promover a cena musical local, nordestina e brasileira. Este ano teremos 2 noites do APR club apresentadas pela Radio 3 da BBC de Londres (eleita a radio do ano de 09 no Reino Unido) e 1 noite apresentada pela Radio Antena 3, de Portugal. Estamos mostrando ao Brasil esse interesse das rádios estatais de Portugal e Inglaterra pela nova música brasileira, não deixa de ser um dedo no olho da nossa decadente comunicação pública, aqui em Pernambuco, principalmente da nossa Rádio Universitária, atrasada 30 anos no tempo e no espaço.

- Pelo visto o festival continua apostando em uma noite mais pesada. Queria que você falasse um pouco porque apostar nessa segmentação e quais os destaques dessa noite.

Paulo André -O público do rock mais pesado sempre foi nosso público mais fiel, com as centenas de shows gratuitos no Ciclo Natalino e no nosso Carnaval Pop, o público mais eclético está farto de shows gratuitos, por isso, reduzimos pra 2 dias, cortamos 1 dia mais pop, diverso. Recife se transformou na maior casa de shows gratuitos do Brasil. De Sepultura a Cidadão Instigado, de Fresno a Silvia Machete, além de todas as bandas pernambucanas de pequeno, médio e grande porte, tocaram de graça nos ultimos 5/6 meses aqui. Nenhuma cidade do Brasil tem uma situação destas, o poder público virou o grande contratante, não o mercado privado. A grande distorção é ver bandas dependendo do $ público, muito mais confortável e mais bem pago, do que sair desbravando o pequeno mercado privado existente no Brasil pra bandas novas e artistas promissores. Ninguém paga nem 5 reais pra ver bandas novas aqui. Em Salvador por exemplo, vocês têm várias casas noturnas onde as bandas novas tocam e movimentam a cena, vocês têm rádio, programas etc. Vocês estão muito melhor nesse aspecto.

- Na segunda noite temos um grande apanhado de artistas de diversos estilos, com algumas das principias apostas do cenário independente de hoje. A proposta foi juntar esses nomes? Como vê esses artistas no cenário atual?

Paulo André – Vejo que esse cenário cresceu e evoluiu muito, principalmente pela circulação que os festivais brasileiros oferecem a estes novos artistas, diferente dos anos 90 onde o caminho era o Sul/Sudeste apenas . O mercado brasileiro é bem desafiador e, depende muito da capacidade de circulação dos artistas, o futuro deles. Eu vou fazer uma turnê com DJ Dolores e banda, que vai passar pelos principais festivais de verão do Canadá e pelos EUA. A tour só será viável porque serei o produtor da tour, o vendedor de cds e o motorista da van nos percurssos terrestres, são bandas legais do mundo inteiro pleiteando esse espaço e, precisa ser muito competente e original musicalmente pra entrar neste circuito. Dolores é um artista 100% independente, mas se eu for esperar o mercado brasileiro melhorar, complica. O Abril Pro Rock desde sempre foi um festival diverso, abrangendo desde a cultura popular até o mais extremo heavy metal, desde a música eletrônica brasileira, até atrações internacionais que de outra forma jamais viriam ao Brasil. Diversidade sempre…

- Um mainstream falido e uma cena independente com ótimos nomes, o que acha que falta pra alguns desses artistas do circuito independente darem o pulo do gato e crescerem já que não são mais as gravadoras que faz esse papel?

Paulo André – Não há uma fórmula, há trabalho e muito. Nesse novo formato de mercado, só vai se consolidar quem tiver estratégia, persistencia e vontade de trabalhar. Muita coisa mudou pra melhor, os editais de circulação, as associações do mercado musical, as feiras, os festivais, mas cada um tem que saber pra onde quer ir e onde quer chegar, senão vira um barco sem rumo. Há 5 anos, as bandas do mainstream do rock e pop brasileiro, passavam pelo Recife 4 ou 5 vezes por ano, hoje no máximo 1 ou 2 vezes. O outro lado é que já estamos em 2010 e, a década passada não teve nada de muito expressivo em termos de novos artistas, formando grande público. Isso reflete a nova configuração deste mercado. Ou se sobrevive assim, ou não se consegue circular. Acho que o que todos querem é a circulação da música e do show.

- Como você vê o papel dos festivais no dias de hoje? Quais as maiores dificuldades para se produzir um?

Paulo André – Fundamentais para a cena brasileira. Sou de uma geração que desbravou caminhos, sem um circuito ou calendário de festivais legais em todas as regiões do Brasil. Desbravei não só nacionalmente, mas internacionalmente também. Hoje, pra uma banda boa, existe um cenário muito positivo e pulsante em todo o Brasil, vai depender da vontade de trabalhar e desbravar de cada artista ou banda. O disco já não dá mais $, o desafio é a circulação, pra novos artistas existe um circuito formado e consolidado. Pra um artista com uma sonoridade brasileira, existe um grande mundo a ser desbravado, ainda mais com a comunicação mais fácil via internet. Por outro lado, a concorrência aumentou e muito, porque ficou mais fácil pra bandas do mundo todo também. As dificuldades dependem dos objetivos. Tem gente que cria festival pra ganhar $, nas minhas palestras sempre falo que coloquei o trabalho na frente do $. Se tivesse ido pelo $ apenas, teria parado há 13/15 anos atrás, mas eu enxergava um futuro muito além disso.

- Como os festivais podem contribuir para tornar a carreira de bandas e artistas sustentável e viável?

Paulo André – Com as bandas que produzo, prefiro muito mais tocar em um festival, do que fazer mais um show naquela cidade. Os festivais tem alto poder de promoção de um novo artista, junto ao seu futuro público, dá uma visibilidade muito maior, abrindo caminho pra banda chegar depois na cidade com seu show. Os festivais agregam valor na visibilidade, promoção, circulação e no processo de formação de público. Com as bandas que trabalho, sempre digo, não importa como estamos aqui, importa que estamos aqui. Quanto ganhamos, ou quanto investimos é problema nosso, cada um sabe pra onde e como quer ir. Há pelo menos 10 anos pagamos cachês e ajuda de custos a todas as bandas que passam pelo APR, mas ninguém é obrigado a aceitar. Mas, existe um equívoco de bandas e produtores em achar que os festivais são a hora de pedir um cachê mais alto. Como produtor sempre tento viabilizar um show ou festival importante que nos interesse, deixo pra ganhar um cachê melhor quando tocamos pra prefeituras, governos, SESC, centro culturais de bancos, grandes empresas, etc. Mas, sou radicalmente contra artistas sobreviverem do $ público.

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