segunda-feira, 9 de setembro de 2013

LUIZ EDUARDO (Crove Horrorshow), uma entrevista

Fundada em Aracaju nos anos 80, a CHS foi pioneira no Rock autoral feito em Sergipe, ao lado de bandas como Karne Krua, Fome Africana, H2O e Guilhotina, e tornou-se referência e inspiração para muitos que depois viriam a formar suas próprias bandas. O power-trio bebe na fonte do rock setentista, do pós-punk inglês e da Soul Music e transmuta tudo isso num som totalmente original, capaz de agradar admiradores dessas e de outras vertentes do Rock, e por que não dizer, de outros gêneros musicais também. A banda está lançando em Aracaju, no próximo dia 04/10, o seu primeiro CD, intitulado “Depois do Rock”, já disponível para venda nas melhores lojas locais. 

Marcus Vinnas: Lembro-me de assistir a um show do Perigo de Vida, sua 1ª banda, em 1985, (inclusive o 1o show de rock a que assisti) num centro social no Conj. Sol Nascente. Como era o som dessa banda, o repertório era todo autoral? Quando você montou o Crove, aproveitou algum material do PDV?
 

1994
Luiz Eduardo: A história foi a seguinte: um amigo meu me levou pra assistir um ensaio da banda H2O, que tinha Alexandre, André, Adelmo (que hoje bota som) na bateria e Mercinho no baixo. Os caras faziam cover de Beatles, Rolling Stones etc. Fiquei besta, vendo pela primeira vez guitarras, baixo e bateria. Eu já tocava violão, tirava vários sucessos da MPB e alguns rocks nacionais. Peguei a guitarra de Alexandre e toquei umas músicas do Barão Vermelho e Paralamas e os caras se surpreenderam, uma vez que eles não conheciam ainda esse repertório. Isso foi em 83, no início da explosão do rock no Brasil. O cara que me levou no ensaio foi Wilton, que eu tinha conhecido através de Silvio, do Karne Krua, mas nessa época a gente era mais surfista do que roqueiro. Mercinho brigou com os caras e me procurou pra montar uma banda. Chamei Sérgio Pauleira, que eu conhecia das rockadas da casa de Edvan, "o rei do rock", no Leite Neto, e montamos o Perigo de Vida (a ideia do nome foi de Sérgio). O som era rock and roll com guitarra distorcida, embora Sérgio quisesse que fôssemos heavy metal. Eu era do fã clube de Raul Seixas e ouvia muito Barão Vermelho, Herva Doce, mas também rock pesado (Hendrix, Deep Purple, Led Zeppelin e Black Sabbath) e progressivo (Pink Floyd, Genesis) nessa época. Nosso repertório era todo autoral. Fizemos uma versão de uma música do Judas Priest (Electric Eye), com letra em português de Sérgio. Esqueci o título que a gente deu, mas Sérgio com certeza ainda lembra. Tínhamos um repertório de mais de dez músicas (a maioria eu ainda toco e lembra das letras). Em 85, no show que você viu, estávamos em nossa última formação (antes Kennedy tinha tocado bateria na banda, e depois Sérgio de novo), que contava com George na bateria e Ricardo Cadastro na guitarra base. Briguei com Mercinho e a banda acabou em 85, quando montei outra banda, o Crove, que contava com Tony Almada, que depois tocou no Karne Krua, na batera e Wirlan Sardinha no baixo. Participamos num festival de música desse mesmo ano, organizado por Jorge Lins na orla de Atalaia, com a música Luzes da Noite, e já com Odara na bateria. Não aproveitamos nada do Perigo no Crove, pois na época do Crove eu não gostava mais de rock pesado e tinha outras referências, como Echo and the Bunnymen, Cure, o próprio U2 etc. No disco resolvemos gravar uma música do Perigo, Sobre o Tempo, que desencabei do baú. 

As composições do Crove são todas de sua autoria? Quem são seus compositores e cantores favoritos?
Sou eu que componho, letra e música. Os arranjos são feitos pela banda, nos ensaios. Há participações de Odara nas letras e concepções de algumas músicas. Cantores e compositores favoritos, deixe eu ver… Tem um monte de gente, mas no Brasil destaco Gil, Lô Borges, Renato Russo, Renato Ladeira, e de fora tem Siouxsie and the Banshees, que considero a maior banda de rock de todos os tempos, Robert Smith, Maurice White, do Earth, Wind and Fire etc. 

Ouvindo o som do Crove, noto o uso de voicings muito originais, com cordas abertas (como em Catedral, p. ex.). Eu também gosto muito desse tipo de voicings, mas comecei a utilizar bem depois, quando comecei a ouvir Rush/Alex Lifeson. Quais são suas influências na guitarra e de onde vieram essas - e as outras - idiosincrasias do seu som?
Acho que a sonoridade do Crove, nos anos oitenta, tentou se basear em bandas inglesas como Echo and the Bunnymen, Siouxsie and the Banshees, The Church e The Cure, mas melódica e harmoniosamente sou muito influenciado pela MPB, pelo som de Minas, Zé Ramalho etc. Nosso rock é o rock do chorus, do pós punk do final dos anos 70 e início dos 80. Nos anos 90 demos uma namorada com o grunge norte-americano, e ouvi muito Soundgarden e Nirvana, influências bem visíveis em músicas como Geração Ropinol e Barra Pesada. Depois nosso som ficou mais solto, misturando às vez os dois registros, como em A Dança do Forró, e vez por outra me pego fazendo musicas semelhantes às dos anos 80, que é nossa "marca registrada", por assim dizer.

Quais suas músicas favoritas, dentre o repertório do Crove?
Gosto mais das dos anos 80 atualmente. Das que estão no CD, Tudo, Não Mais, mas curto também as dos anos 90, como Catedral, A Dança do Forró etc. Estamos ensaiando para o show de lançamento músicas mais antigas, como Você, Nada, Agora, e são as que estou mais curtindo atualmente.

Por que a bela “Nada Passou” ficou de fora do CD?
Porque deixamos de tocar essa música nos shows desde que Gutierre (N.R.: Gutierre de La Peña, baixista) saiu da banda, em 96, de modo que ela não fazia parte do nosso repertório de show, com a formação atual.


Para os gearheads: que guitarras, efeitos e amplificadores você usa/usou, ao vivo e no CD? Seu som é “dependente” de algum efeito ou o Crove poderia fazer um show somente com guitarra, cabo e amp?
O Crove tocaria só com guitarra e amp se eu tivesse uma PRS como a que gravei, emprestada de Yuri Garin, e um Amp com qualidade equivalente. Como não tenho, atualmente uso a minha velha Epiphone estilo Les Paul com um Fuzz Face para distorção e um chorus MXR para as músicas Croveanas, além de um Cry Baby para algumas ocasiões. No repertório dos anos 80 só uso chorus, pois quando o Perigo de Vida acabou, minha ideia era fazer uma banda com esse novo estilo, a tal da "new wave", como se dizia. A distorção surgiu mais no Crove com a moda grunge dos anos 90. Mas vez por outra uso solos distorcidos em algumas músicas.

Você mantém alguma rotina de estudos/prática de guitarra? Em algum momento da vida você teve lições formais de Música?
Rapaz, vergonhosamente, só pego na guitarra quando ensaio ou toco em shows. Em casa só toco violão, nos intervalos de minha vida acadêmica (N.R.: Eduardo é também professor da Universidade Federal de Sergipe). Às vezes ligo a guitarra e fico tocando, acompanhando algum som, mas só pra tirar onda. Aprendi a tocar e a cantar na rua: fui de uma época em que quase todo mundo andava com um violão debaixo do braço, levando-o até pra escola, então aproveitei isso, junto com certa aptidão para pegar as músicas pelas revistinhas de cifras. Se você conseguisse tocar violão e cantar com certa desenvoltura, já tava pronto, pelo menos para se destacar entre os colegas de turma da escola. Depois que participei de um festival de música do Colégio Salesiano, com uma composição minha e de um colega, Dilson, entrei numas de fazer minhas próprias músicas no violão. E até hoje tô nessa. As músicas do Crove surgem primeiro no violão.
Quando, como e por que você decidiu que seria músico? Você se realiza mais compondo, tocando guitarra ou cantando?
A ideia de montar uma banda tem a ver com o lance de ser roqueiro, com uma certa rebeldia meio alienada, e por eu achar que tenho algo interessante a dizer. Eu mesmo gosto das coisas que faço e toco e canto sempre movido pelo prazer de tocar e cantar e mostrar minha música para as pessoas.

O Crove Horrorshow tem admiração praticamente unânime entre os roqueiros da minha geração. Como você definiria o som do Crove, e por que você acha que o som dela atinge admiradores de tantas vertentes do Rock?
Acho que o Crove virou uma banda cultuada entre várias gerações de roqueiros porque, apesar de nossas paradas, acompanhamos o desenrolar de várias gerações. Sem Grana, por exemplo, é uma música dos anos 80, mas até hoje a galera pede nos shows, porque virou uma marca da banda, e ela tocava na época da hegemonia do chorus, mas também na época do grunge e da febre do mangue bit.

Fale sobre a entrada de Fábio, o mais novo integrante, por sua vez baixista e compositor de outra banda também histórica do Rock Sergipano, a Snooze. Podemos esperar parcerias inéditas em termos de composições?
Ainda não compusemos juntos, pois Fábio se colocou desde o início como fã da banda e passou muito tempo pegando nosso repertório, que é muito longo. Ele fez grandes arranjos de baixo no disco e curte muito nosso som. Fabinho entrou na banda dois anos depois que cheguei do doutoradoTínhamos nos encontrado em São Paulo, através de Álvaro Alexandre. Como a gente tava sem baixista, depois da saída de Chico Pitanga e do término da Funkin' Soul, nos encontramos no Capitão Cook num show dos Mamutes e lhe fizemos o convite, eu e Odara. Ele topou e começamos a ensaiar. Isso foi em 2008.

Como surgiu a decisão de entrar em estúdio e gravar o CD “Depois do Rock”? O repertório é todo de material antigo ou há músicas recentes? Como foi o processo de gravação desse álbum? 
Antes de eu viajar para Portugal decidimos gravar o Depois do Rock (o título quem deu foi Odara), com músicas de todas as nossas fases, com ênfase para algumas mais recentes. Selecionamos 12 das que vínhamos executando nos shows com Fabinho. No total, o Crove tem uma média de cinquenta músicas.
Podemos esperar mais um CD de inéditas do Crove Horrorshow? Se sim, para quando?

Claro. Precisamos registrar ainda muita coisa. No próximo ano começamos a gravar o novo disco. E será um disco com a maioria de composições dos anos 80 (talvez Nada Passou, que é dos anos 90, entre).

Como você vê o cenário atual do Rock Sergipano? O que mudou em relação a 25 anos atrás? 
Muita coisa mudou e muita coisa continua igual, sobretudo no que toca a mercado, público e apoio de instituições públicas e privadas. Há hoje uma diversidade maior, com muitas bandas autorais, com estilos diversos. As bandas também começaram a romper as barreiras de nosso estado, apresentando-se em outros estados e até no exterior. Me sinto muito bem em estar vivendo e participando desse momento.

Ouço Joubert Moraes, meu tio, falar muito da genialidade de Marcos Preto (compositor da geração dele), mas de quem nada se fala hoje em dia e que não deixou nada registrado, e como ele há muitos. Fico aliviado em ver que uma grande banda, de uma época em que gravar era muito difícil, conseguiu resistir ao tempo e registrar de modo tão fiel o seu material. Que outras bandas e artistas dos primórdios do Rock Sergipano você gostaria que tivessem legado registros consistentes, para as gerações futuras?
Marcos Preto, ou Marcos Chulé, é irmão de um brother meu, Gilmar Bob, que também já foi  vocalista do extinto Filhos da Crise. Ouvi as músicas de Marcos Preto através de Bob. Ele tinha ganhado um festival de música em 68 ou 69, com a música Cruzada, aqui em Aracaju. Gostaria de ver gravadas as músicas do Alice. De ver mais registros do Karne Krua, que é a banda de rock mais importante de Sergipe, por nunca ter parado desde o início de sua trajetória, mas gosto também de muita coisa dos anos 80 que ainda não gravou suficientemente, Tonho Baixinho, Paulo Lobo, Joésia, Mingo Santana, Chico Queiroga, Rogério, Edelson Pantera, para citar apenas alguns.

Fique à vontade e mande uma mensagem para os fãs da banda (e para os futuros fãs também).
O nosso disco foi feito com muito carinho, depois de uma gestação de mais de dois anos. Esperamos corresponder às expectativas. 

Fonte: Blog do Vinnas 

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